Por Dr. Vitor Almeida Ribeiro de Miranda
No último dia 11/09, o atleta de futebol americano Aaron Rodgers (NY Jets) sofreu uma lesão do tendão de Aquiles durante a partida contra o Buffalo Bills. As imagens do momento exato da lesão viralizaram. O atleta foi operado poucos dias depois e se recupera bem. Desejo toda a sorte e boa recuperação a ele.
– Mas Dr. Vitor… Quando é que se opera lesões do tendão de Aquiles?
Essa é uma dúvida recorrente. Vamos entender essa questão.
O tendão de Aquiles é uma das estruturas mais fortes e importantes do corpo humano, e desempenha um papel crucial na capacidade de locomoção e estabilidade. No entanto, lesões nessa região podem ocorrer e frequentemente afetam indivíduos ativos, como atletas e praticantes de esportes de alto impacto. Neste artigo, exploraremos as lesões do tendão de Aquiles, com foco no tratamento cirúrgico em pacientes ativos, respaldado por evidências recentes.
Afirma Dr. Vitor Miranda.
Anatomia e função do tendão de aquiles
O tendão de Aquiles, ou tendão calcâneo, é o maior tendão do corpo humano e une os músculos da panturrilha (o tríceps tríceps sural, composto pelos gastrocnêmios e sóleo) ao osso do calcanhar (calcâneo). Sua principal função é permitir a flexão plantar do tornozelo, possibilitando a caminhada, corrida e salto. Devido à sua importância funcional, qualquer lesão nessa estrutura pode ter um impacto significativo na qualidade de vida do indivíduo afetado. As lesões agudas do Aquiles podem ocorrer em diferentes zonas do tendão e têm diferentes características:
• Zona miotendínea: zona de transição do músculo para o tendão.
Nesta zona, o suprimento arterial é muito rico e a área de contato entre as partes do tendão e músculo é grande. Com isso o prognóstico em termos de cicatrização é bom. Neste ponto, a lesão pode ser parcial ou total e o/a paciente sente dor aguda moderada a intensa e perda funcional parcial ou total, a depender da extensão da lesão. Quando a lesão é parcial, há maior dificuldade diagnóstica, pois o quadro clínico é muito parecido com um estiramento muscular. Desta forma, exames de imagem ajudam a elucidar e quantificar a extensão da lesão;
• Zona tendínea propriamente dita: no meio da substância do tendão, onde o suprimento arterial é pobre e a área de contato pequena. Além disso, as forças que agem nesse ponto provocam maior afastamento das partes do tendão rompido. Nesta Zona, as rupturas geralmente são agudas e completas, com perda da continuidade do tendão, que leva a perda funcional imediata. O/A paciente sente dor moderada a intensa no momento e já nem consegue mais andar ou anda com muita dificuldade. São as lesões mais sintomáticas. O diagnóstico dessas lesões é relativamente simples. O teste de Thompson é realizado pelo(a) médico(a) e quando positivo é patognomônico da lesão completa. Este é um teste simples executado com o paciente em decúbito prono. Basta fazer uma leve compressão látero-lateral da panturrilha e, se o pé não se mexer, o teste é positivo para a lesão. Quando o tendão está íntegro, o pé se move em flexão plantar (teste negativo para lesão).
• Zona insercional: também chamada de êntese.
Nesta Zona, ocorre a inserção do tendão no osso calcâneo, e a composição celular e extracelular é completamente diferente das Zonas Tendínea e Miotendínea. Rupturas na Z. Insercional geralmente estão relacionadas à patologia prévia do tendão e outras doenças como diabetes, Espondilite Anquilosante, Artrite Reumatoide etc. O quadro clínico geralmente é de dor crônica no local que piora agudamente após leve trauma, ou seja, dor crônica agudizada.
Tipos de lesões do tendão de aquiles
As lesões do tendão de Aquiles também podem ser classificadas de acordo com a cronologia em lesões agudas e crônicas.
1. Lesões agudas: Essas lesões ocorrem de forma repentina, geralmente durante uma atividade esportiva ou movimento brusco. Podem variar desde uma distensão leve até a ruptura completa do tendão. Fatores genéticos, idade avançada, falta de aquecimento adequado e desequilíbrio muscular podem aumentar o risco de lesões agudas. Nessas lesões o/a paciente geralmente se queixa que “tomou uma pancada na panturrilha”, a chamada Síndrome da Pedrada;
2. Lesões crônicas: Lesões crônicas são geralmente o resultado de sobrecarga repetitiva do tendão ao longo do tempo. Isso pode ocorrer devido a atividades esportivas de alto impacto ou calçados inadequados. A tendinopatia de Aquiles é um exemplo de lesão crônica que pode causar dor e diminuição da função.
Tratamento não cirúrgico vs. cirúrgico das rupturas agudas
O tratamento das lesões agudas do tendão de Aquiles pode ser dividido em abordagens não cirúrgicas e cirúrgicas. A escolha entre essas opções depende da gravidade da lesão, estilo de vida do paciente e objetivos funcionais. Em pacientes ativos, o tratamento cirúrgico tem sido cada vez mais defendido com base em evidências recentes.
Tratamento não cirúrgico
O tratamento não cirúrgico geralmente envolve imobilização, fisioterapia, analgésicos e medidas de autocuidado. É uma opção viável para lesões agudas menos graves, lesões agudas na zona miotendínea ou lesões agudas em pacientes idosos e com baixíssima demanda. O tratamento envolve imobilização funcional com bota Robofoot® com Kit Aquiles®, que deixa o pé em flexão plantar, e permite o apoio com carga parcial e reabilitação precoce. No entanto, estudos têm demonstrado que pacientes jovens, ativos ou atletas podem enfrentar desafios significativos na recuperação e retornar às suas atividades normais com tratamento conservador.
Tratamento cirúrgico
O tratamento cirúrgico de lesões agudas do tendão de aquiles envolve a reparo da área lesionada. Existem várias técnicas cirúrgicas disponíveis, incluindo a sutura aberta e a sutura minimamente invasiva. A escolha da técnica depende da extensão da lesão e da experiência do cirurgião. As técnicas minimamente invasivas trazem vantagens na recuperação, principalmente se associadas a protocolos de reabilitação funcional precoce.
Vantagens do tratamento cirúrgico em pacientes ativos
- Recuperação mais rápida:
Pacientes ativos geralmente buscam um retorno rápido às suas atividades esportivas. A cirurgia tende a oferecer uma recuperação mais rápida em comparação com o tratamento não cirúrgico. - Menor risco de recidiva:
Estudos recentes demonstraram que o tratamento cirúrgico pode reduzir o risco de recidiva da lesão, especialmente em pacientes ativos que desejam retomar esportes de alto impacto. - Melhor Função:
A intervenção cirúrgica pode proporcionar uma reparação mais precisa do tendão, resultando em uma função melhorada em comparação com tratamentos não cirúrgicos.
Evidências recentes
Um estudo publicado no “American Journal of Sports Medicine” em 2020 analisou os resultados de pacientes ativos com lesões agudas do tendão de aquiles submetidos a tratamento cirúrgico.
Os resultados mostraram uma taxa significativamente mais alta de retorno ao nível pré-lesão em comparação com pacientes que optaram por tratamento não cirúrgico.
Além disso, a taxa de recidiva foi menor no grupo cirúrgico.
Considerações finais
As lesões agudas do tendão de aquiles podem ser debilitantes, especialmente para pacientes ativos. Embora o tratamento não cirúrgico seja uma opção válida em alguns casos, evidências recentes indicam que o tratamento cirúrgico pode ser uma escolha mais benéfica para pacientes ativos que desejam uma recuperação rápida, menor risco de recidiva e melhor função.
No entanto, a decisão final deve ser tomada em consulta com um ortopedista especializado, considerando as necessidades individuais do paciente e a extensão da lesão. É fundamental que os pacientes recebam orientação adequada para tomar a decisão mais informada sobre seu tratamento.
Vitor Almeida Ribeiro de Miranda é médico cirurgião ortopédico, mestre em ciências biológicas
aplicadas ao sistema músculo-esquelético, especialista em Cirurgia do Pé e Tornozelo e membro
titular da SBOT e ABTPÉ.
@docvitorarmiranda